domingo, 15 de janeiro de 2012

Entrevista com o Mino - Parte III

Nessa parte, Mino fala sobre o advento das mídias digitais para a publicação de produções artísticas, o fenômeno “mangá” e a transposição do público dos quadrinhos – antes jovem, hoje cada vez mais adulto –, e comenta sobre a charge política e a “gaiatice” dos políticos brasileiros. 
As fotos são da Gabriela Custódio. Pra ver mais fotos da entrevista com o Mino - e muitas outras bem legais -, dá uma checada lá no blog dela ;) http://meumundoenquadrado.blogspot.com/


Mino, por Gabriela Custódio
Panz! - A gente sabe que o espaço impresso parase publicar cartum ou charge é muito pequeno, e na internet ocorre um fenômeno recente que é a criação de sites destinados especialmente para publicar cartuns, tirinhas, etc. Como o senhor avalia isso?

Mino – Eu acho que isso é uma coisa muito boa, tanto quanto foi o cinema para o teatro. Quando começou essa história, o teatro viu-se ameaçado. Vinha desde o tempo dos gregos: teatro, teatro, teatro... Ai vem o cinema: pronto acabou o teatro! Mas tá ai o teatro. Ai veio a televisão: pronto acabou o cinema. Tá aí o cinema! Ai tá aí a internet, o que vai ser da imprensa... Não acaba! Tem um somatório de coisas fantástico. Eu tou me preparando para daqui a uns tempos “ internetzar” esse material [a Rivista]: fazer algumas animações, criar um site, aquela coisa toda. Só não sei como passar isso agora, e eu não tou preocupado agora, porque eu não tenho capacidade de ir lá e fazer isso, mas assim que aparecer um internauta bom... Meu filho já tentou fazer com a parte das pinturas, e eu já tou selecionando as fotos para jogar lá. Antigamente a gente fazia um catálogo “dessa grossura”, que para vender tinha que ser por cem reais, e para fazer você imagina o preço. Mande pelos correios um bicho desse tamanho e você já fica pobre. Isso mudou. Eu posso ter um catálogo para mandar para alguém de vez em quando, mas esse catálogo pode ir na internet. Ganha o mundo.
Só que o pessoal tá pensando que a internet é uma coisa meio miraculosa. Ela tem suas limitações. Eu, apesar de não saber manejar, sei de uma coisa: se eu botar 700 quadros na internet, muita gente que tá pesquisando pintura brasileira vai chegar lá. Mas também se eu mandar um bilhetinho “desse tamanhinho” pelo correio, o velho correio, se eu mandar 3 mil bilhetinhos desses dizendo para alguém, lá na China, por favor acesse meu site, esse alguém lá na China entra no site. Mas eu vejo tudo que chega de novidade como uma coisa agregadora. Rapaz, quem é que vai substituir aquele livrinho que você bota pra cá, bota pra lá, que você dorme com ele? (risos). E as pessoas que adoram o livro mesmo, que cheiram o livro, que têm coleção... Tem gente que guarda o livro só pela beleza. Tem outros que lêem mesmo. É a paixão pelo livro, e eu acho que essas coisas não são substituíveis. Tem várias peças de teatro que foram filmadas e que viram filmes, e filmes que viram peça de teatro. E história em quadrinhos que vira filme. A coisa que eu achei mais fantástica foi o Batman e os quadrinhos ganhando a magia do cinema! Nunca pensei que o cinema fosse capaz de fazer isso! E o que eu acho bacana é que isso é que é cinema de arte para mim, porque aquela tecnologia é arte pura.


Panz!- De uns tempos para cá, a gente observa uma tendência de quadrinhos direcionados para adultos, o que é observado principalmente nos mangás. Como você enxerga essa transposição do público dos quadrinhos?

M- Eu ainda não arregalei os olhos para essa história de mangá, porque eu ainda não li nenhum. Eu sei que deve ser uma coisa espetacular, para reunir quarenta mil pessoas num negócio desses [SANA]. Deve ser um negócio incrível, mas eu ainda não alcancei. Não tive tempo ainda de chegar e pegar uma revista de mangá. Aliás não é só mangá, não. As revistas atuais mesmo de Batman e de outras coisas, eu tou muito tempo longe disso. Eu tenho até medo de desencantar um pouco. Eu não sei por que eu não tenho mais tempo de ler uma história em quadrinhos como eu tinha antes. Eu gostava! A maior alegria do mundo era uma coca-cola, um sanduíche e um abajur aqui e eu na cama lendo uma história daquelas: do Mickey, do Pateta, do Pato Donald e outros personagens que tinham que eram engraçadíssimos. Mas eu não entendo não [os mangás]. Tem aqueles raios, aquelas coisas todas... Não sei se isso é tão benéfico, não sei se pelo fato de eu conhecer, quanto o trabalho da Disney, porque quando você vê um desenho animado da Disney, aqueles desenhos cheios de ternura, o que é melhor para cabeça dessa geração, ou de qualquer geração, esse mundo encantado ou esse mundo mais pesado? Eu não sei. O futuro é que vai dizer. Mas o fato é que os meninos tão botando para dentro da cabeça muita coisa pesada. Um dia desses, tava passando um filme que, quando eu vi uma cena, eu não acreditei. Um cara amordaçando uma mulher, o outro filmando, ai ele pega uma faca “deste tamanho”, e eu disse: isso é bem algum truque que esse cara vai fazer, ai páaaaaaaaaa! E o sangue espirrando, ai páaa... na frente da televisão! Olhe, eu vou dizer uma coisa a você: nós nunca assistimos a um filme que tivesse isso a uns trinta, quarenta, cinquenta anos atrás! O que é que isso vai gerar na cabeça de uma pessoa?! Eu desliguei logo, porque eu sei que ali pode virar pesadelo, porque eu não tomo mais banho de mar tranquilo por causa de “Tubarão” (risos). Um dia desses, eu ouvi um cara dizendo mesmo: o Spilberg deu para todo mundo o medo do mar. Antigamente eu ficava boiando na água do mar. Uma vez eu fui pra fazenda do meu sogro, quando foi de noite, minha mulher me pediu para ir comprar coca-cola num lugar que era lá do outro lado do açude, num escuro danado! Eu fui. Quando foi na volta, que eu vim no escuro, tudo quanto era monstro de cinema apareceu (risos)! Eu comecei a ficar com medo e pensei: rapaz, isso não existe não! Isso é coisa de cinema! Aqui deve ter é uns “bichim” por aqui, uns passarinhos, umas cobras (mais risos)! É o medo alojado na cabeça da gente. É de tanto ver filme. Desde “Psicose”, com aquela cena lá: pam, pam, pam... Se eu vir uma banheira, e um chuveiro aberto, pronto (risos)! Eu não sei se isso é bom, porque dizem os psicólogos que isso faz parte da psiqué da gente, esse negócio de ter medo, e conviver com esse negócio, né?Eu não sou capaz de fazer isso. Eu não sou capaz de imaginar fazer um livro, uma história, com esses ingredientes de jeito nenhum. Eu faço brincando. Tem até um episódio do Capitão Rapadura do tipo suspeito, que a mulher dele liga e diz: venha cá, tem um tipo suspeito aqui na esquina. Ele vai com aquela velocidade dele todinha e quando chega lá diz assim: “alto lá, tipo suspeito! Quem é você?”. Ele diz: “sou um tipo suspeito”. O capitão diz: mostre sua carteira. Ele mostra a carteira e tem lá: tipo suspeito (risos). No final da história, a mulher dele pergunta: “Afinal, Capitão Rapadura, quem era aquele homem?”. Ele diz: “era só um pobre tipo suspeito” (mais risos). Mas voltando ao mangá: ainda não li. Ainda não tive a oportunidade de ler. Por isso que eu não posso fazer nem a crítica, nem o elogio, nem nada. O elogio eu faço pelo resultado, que não deve ser à toa. Mas também não vou elogiar a tatuagem porque tem mil pessoas tatuadas. Tem tantas coisas no mundo que eu não entendo. O mangá é mais fácil de explicar porque é desenho, é bonito e deve ter algum substrato. Mas por exemplo, a tatuagem eu não entendo. Eu não entendo como é que uma moça de uma pele dourada, bonita, faz uma marmota daquelas (risos)! E não sai, né? Às vezes eu não entendo essa geração de hoje. O meu filho com piercing na orelha, o José, e eu disse “toda vez que você furar a orelha eu furo também viu, Zé?”. Ele disse: “você não pode, você é meu pai!” (risos). Eu não entendo, deve ter alguma razão.

Gabriela, Murilo, Alissa, Carlitos e Pedro, a galera da Panz!, no ateliê do Mino

Panz! - O senhor disse uma vez, em uma entrevista, que tinha parado de fazer charge porque "o político por si só já é engraçado". E, hoje, o Tiririca foi eleito o deputado mais votado do país. Qual é a opinião do senhor sobre esse assunto?


Mino - Eles são gaiatos, mas eles não têm graça. Eles dizem e fazem tanta besteira que, se você juntar tudo, dá uma obra fantástica de comédia. O que tá incomodando eles [os políticos] nessa história do Tiririca é que ele é o retrato, a caricatura, a charge da política atual. A cara do nosso Congresso. E ele é a cara inocente, porque é um palhaço. Ele não vai roubar ninguém. Ele não tem capacidade de roubar milhões. E quanto mais grosso um político fala, mais ladrão ele é. Não são os analfabetos que estão roubando milhões, são os altamente alfabetizados. É raríssimo você encontrar um homem de bem. Eles estão saindo. Enquanto Collor volta, Guimarães volta. Nós, cartunistas, que somos simples artistas, estamos cada vez mais políticos em nosso ponto de vista. Mas eles, políticos, se observados, é que estão ficando cada vez mais engraçados.

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