sábado, 7 de janeiro de 2012

Entrevista com o Mino - Parte II

Nessa segunda parte, Mino fala sobre o trabalho com a internet, os problemas de se criar uma revista e seu personagem mais conhecido, o Capitão Rapadura. Fotos, mais uma vez, da Gabriela Custódio.

Mino



Panz! - Mino, o senhor nos fala que não tem muita paciência para assistir televisão. E com a internet? O senhor tem acompanhado?

Mino - Eu sou um primata na internet (risos). Não sei nem lidar com o computador ainda. Eu sei o que ele faz, e trabalho junto a alguém que sabe mexer. Conheço só as técnicas que existem nele, e sei que todas as técnicas que existem no mundo estão lá dentro. Mas eu sei que esse “bicho” é perigoso! Teve uma vez que eu fui na Verdes Mares, e tinha um cara que era um “crânio”, mas o cara já me recebeu de cara feia porque eu tava atrapalhando o programa dele. Deu uma hora de aula, eu do lado dele e ele falando sozinho. Decidi procurar outra pessoa. Não encontrei um professor que me passasse o que era o computador! Meus amigos me enchiam o saco: “você precisa ter um computador!”. Um eu disse: “agora eu preciso ter um. Isso não quer dizer que eu vá aprender a mexer, mas eu preciso ter”. Fui em uma agência de publicidade e lá tinha a Edileusa, que me mostrou como é esse negócio de desenho no computador. Eu fiz um desenho fora e ela colocou no escâner. Ai eu fui dizendo: “faça um céu aqui uma bolinha ali...” O desenho ficando bonito e eu, entusiasmado. Chamei a moça para trabalhar comigo e a partir dai eu comecei a transpor os meus desenhos para o computador: eu ao lado dela. Fui dizendo como colorir o desenho de tal forma que hoje, o Simões, que é o cara que trabalha comigo, já sabe praticamente o que eu quero. Se eu tivesse fazendo essa parte, eu não estaria com essa quantidade de trabalhos toda. Eu quero é mas gente trabalhando, e se eu tivesse mais dinheiro colocava mesmo.

Panz! - E qual a dica que o senhor dá para quem quer fazer uma revista?

Mino – Simplicidade no começo. Milôr Fernandes uma vez reclamou do Ziraldo porque quando ele tava fazendo essa revista [a “Bundas”, lançada por Ziraldo em 1999] ela tinha marca d'água, tinha uma coisa em cima da outra, uns desenhos saindo daqui, outros saindo dali. Ele dizia: “rapaz, os chineses, não foi à toa que eles inventaram essa leitura que vem da esquerda para a direita e descendo e toda a nossa leitura é feita nesse sentido. Não adianta complicar que você não vai inventar outra coisa além disso. Então deixe uma coisa boa para o leitor ler, e faça uma boa ilustração pro leitor ver, e se você tem uma coisa que quer que o leitor não veja, esconda!”. Hoje as revistas, depois da era do computador, tem super efeitos especias, mas o roteiro se perde. Então, eu acho que é a simplicidade. Depois, começar com pequenas páginas. O que eu acho interessante é o seguinte: só começo pelo número zero. A primeira edição que eu fiz tinha número zero: “Almanaque Mino número zero.” Isso é para não perder essa noção de que você tem que começar pequeno. Se você começar com oito páginas, tá ótimo. Depois que dominar as oito, vai para as dezesseis. É aquela coisa da simplicidade mesmo. Daqui a pouco você começa a criar e inventar umas coisas, e o próprio material que você tá criando já começa a pedir de você. E ai depois que você começa a fazer, você vê o seu próprio trabalho impresso e ele lhe impressiona. Ai você se vê no seu trabalho e acontece uma coisa diferente com você que te torna melhor.

O negócio é não parar, poque você sempre volta melhor. E você já entra no conjunto que existe no mundo, que a gente não fala muito nas escolas porque é confundido com espiritualidade e filosofia. Mas o fato é que nós estamos em um universo que está regendo as coisas de uma maneira correta. As coisas erradas tão por conta da gente. Nós somos os únicos seres capazes de errar, né? Esse é o grande privilégio que a gente tem. A natureza não erra. Os animais não erram. São todos instintivos e bem programados, mas o homem erra poque é livre, ele é coparticipante desa programação. Então ele é utilizado de uma maneira mais evoluída, que é a nossa participação, e a inspiração vai vir de lá, tá dentro de você e vem de fora também. Os gregos achavam que vinha só de fora, que eram as musas. A inspiração também vem dos outros. Uma frase que você fala aqui alguém completa e vira uma frase de efeito. Nada é nosso e tudo é nosso, e deve-se ter um respeito poque na hora em que você for pegar uma coisa que já vem muito burilada na sua mão você tem que citar as fontes. E aí a Filosofia entra na Ética. Eu deixei de fazer charge poque eu não queria agredir mais ninguém. Porque o Fernando Henrique Cardoso pode ser o pior homem do mundo, Dilma, Serra... mas eu acho que nessa hora você tá falado de uma pessoa, de um pai de família. Tem que respeitar. Você não pode chegar e debochar, mostrar um retrato dele como se o caráter dele fosse aquilo. Eu aprendi isso com uma surra que eu levei do meu Pai. Eu tinha entre 5 e 7 anos de idade. Tinha uma senhora que morava na nossa rua que, a bichinha, tinha bigode. Ela ia passando no meio da rua e o apelido dela era “bigodeira”, e eu gritava: “bigodeira, bigodeira...”. Papai chegou no jantar e disse assim: aqui nessa casa eu bato em qualquer pessoa que chamar aquela senhora de bigodeira! Tem que ter respeito pela senhora!”. Na mesma hora eu sai lá na porta, que era na Dom Manuel, abri a porta e não tinha ninguém na rua. Ai eu disse: “bigodeira...” Meu pai me deu uma surra, e foi uma coisa que eu nunca esqueci.

Explorar um defeito físico, ou ridicularizar o ser humano, algumas vezes eu cheguei a fazer isso, mas quando fazia era um remorso danado, ai nunca mais fiz. Acabei abandonando a charge, porque a charge é sempre criticando o pessoal. O chargista não pode ser a favor, já pensou num negócio desse? O Neno [Cavalcante, editor do Diário do Nordeste] foi quem me disse isso. Fui fazer uma charge uma vez elogiando o Tasso, que tinha sido eleito, ai ele disse: “ei, Mino, chargista não pode ser a favor!”. Eu fiquei com raiva do Neno, mas ele tinha razão. Depois eu passei a fazer o cartum, que é uma coisa mais da gente, uma crítica nossa mesmo. Nós é que somos engraçados.

Mino desenhando o que seria a capa da edição zero da Revista Panz!


Panz! - Mino, nós sabemos que o Capitão Rapadura foi considerado pela mídia como o maior representante do que seria um herói genuinamente brasileiro. Por que surgiu na sua cabeça a ideia de fazer um herói brasileiro?

Mino – Na realidade, ele seria a caricatura de um super-herói. Não é nem ser um herói brasileiro, é ser a caricatura de um super-herói. Então um super-herói nordestino, imagine como seria.. Teria que andar de jumento, comer rapadura e em vez do pó de pirlimpimpim seria a farinha d'água, ou coisa do tipo. Era mais uma brincadeira. Tanto que as primeiras histórias dele eram brincadeira. Agora quando ele começou a fazer as histórias dele, que ele passou a voar, parece que ele entrou num contexto do Capitão Marvel, do Super-Homem, então ele virou um meio super-herói cearense. Mas é uma brincadeira na realidade, é mais uma gozação. Como é que pode a gente ter super-heroi aqui, né? Mas a colocação que os jornalistas fizeram e que os pedagogos fizeram é o seguinte: que o Brasil, além de não ter super-heróis como Zorro ou o Super- Homem, gosta é do anti-herói. Gosta do Macunaíma, do Zé Carioca. O brasileiro gosta mais disso.

Disseram que para ter o perfil de um super-herói, ecologicamente correto, sem violência, o Capitão Rapadura se apresentava como sendo o melhor. E realmente é poque as historinhas dele não têm pancadaria. Ele não dá soco. Ele pode até levar, mas ele não dá (risos). E o engraçado é o seguinte: todas as histórias do Capitão Rapadura eu tenho ainda aqui guardadas, inéditas. São pouquíssimas histórias do Capitão Rapadura que saíram. E ele é uma lenda! Cheguei em um colégio uma vez, lotado, cheio de gente, e disse: “vou fazer um teste aqui. Quem conhece o Capitão Rapadura aqui levanta a mão. Todo mundo levantou! A segunda pergunta foi assim: “quem já leu uma história do capitão rapadura?” Ninguém. Mas eu tenho as histórias dele, para esse ano [2010]. Tou teimando para esse ano aqui com a ajuda da Socorro, que tá trabalhando comigo, para lançar pelo menos uma das histórias dele para o público conhecer melhor o que ele representa. Porque realmente ele mostra que a Gotham City, a metrópole dele, é Fortaleza, e todas as aventuras são assim: em Quixeramobim, em Tianguá, na bica do Ipu... 

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